O que é e consequências do quiet firing e quiet quitting

Para umas empresas mais, para outras menos, mas independente do caso, a demissão ou desligamento de colaboradores é sempre um assunto delicado e que revela muitas questões relacionadas.

Quando esse é o assunto, dois termos têm ganho projeção recente – quiet firing e quiet quitting.

O que são, quais as suas consequências e o que há pode trás de sua ocorrência, é o que trataremos hoje.

O que é quiet firing e quiet quitting?

São estrangeirismos usados no meio empresarial e neologismos – pelo menos por aqui – usados para designar “demissão silenciosa” e que no caso de firing, é quando ela se dá por parte da empresa e quitting, quando provém do colaborador.

Quiet quitting foi o primeiro termo a ganhar evidência, especialmente em algumas redes sociais e usado mais notadamente pelas gerações Z (Centennials) e Millennials e parece ter sido incorporado ao seu vocabulário por ocasião de movimento análogo ao que se viu nos EUA após algum tempo do início da pandemia do coronavírus.

Lá e logo na sequência aqui no Brasil, justo em meio a crise de desemprego causada pelo lockdown, pessoas começaram a pedir demissão ou quando não, passaram a adotar uma postura passiva e acomodada em seus empregos, limitando-se a fazer o mínimo necessário que o cargo exigisse.

Ao fazer apenas o básico pela empresa, sem preocupar-se em ir além e/ou fazer da melhor forma, ou buscar aprimoramento, crescimento e mesmo feedback quanto aos seus resultados, o funcionário coloca-se em uma posição de pouco interesse por parte da empresa em sua manutenção no cargo, culminando muitas vezes em sua demissão.

Ou seja, sem manifestar-se clara e literalmente, o colaborador mostra silenciosamente o seu descontentamento em relação a sua ocupação profissional.

Quiet firing, tal como seu correspondente sob a ótica do funcionário, é quando a empresa cria um ambiente pouco estimulante e por vezes, pouquíssimo favorável ao desempenho das suas funções por parte do colaborador.

Isso pode ser feito das mais variadas maneiras, como atribuir tarefas complexas e com níveis de exigência maior do que aquelas de seus pares, ou inversamente, delegando coisas monótonas, repetitivas e sem importância.

Em resumo, o cenário vivido pelo funcionário, leva a sentimentos como desmotivação, opressão, exclusão, sem futuro e sem perspectivas positivas, criando um clima insustentável, até que não reste alternativa a não ser pedir desligamento.

Quando surgiram os termos quiet quitting e quiet firing?

Como comportamentos e situações observadas, não se pode dizer que são novidades.

Desde os primórdios das relações empregatícias, tanto um quanto o outro, existiram. Apenas e talvez em menor proporção do que hoje, especialmente no caso de quiet quitting.

Como termos e ganhando espaço de utilização nos discursos das pessoas, com as redes sociais e primeiramente entre os usuários do Reddit. Como se sabe, palavras e expressões que caem nas graças dessas novas gerações, rapidamente viralizam e tornam-se populares.

Mas como já mencionamos, esse movimento ganhou corpo em meio à pandemia, justamente quando relações e formas de trabalho novas precisaram tomar lugar dos modelos tradicionais.

Isso somado ao fato de que o quiet quitting manifestou-se em índices bem maiores justamente nas gerações que viveram a transformação digital e a Internet, que possibilitaram o home office, cultivam as relações virtuais ou no ambiente digital, por vezes em detrimento das relações presenciais, são muito mais propensos a romper os paradigmas e porque não se apegam com o trabalho, mas com a realização profissional e não se veem fazendo as mesmas coisas por uma vida inteira, em certa medida explicam esse tipo de comportamento.

Ou seja, a pandemia só veio escancarar suas naturais crenças de que os modelos consolidados e tradicionais de trabalho precisam mudar para acomodar novas gerações.

O que há por trás do quiet firing e do quiet quitting?

Simplesmente imaginar que tanto um quanto o outro devem ser aceitados, apenas porque em algum grau sempre existiram, não é uma opção adequada.

Não se trata somente de admitir que as novas gerações e que estão ocupando cada vez mais o mercado de trabalho, são e comportam-se diferentemente de seus pares e predecessores de outras gerações.

Mas de enxergar como estão estruturadas as organizações, como é sua cultura, sua filosofia, sua visão e missão, afinal para algumas empresas até é possível contratar ainda aqueles para os quais os modelos do passado serviam, mas não por muito tempo.

Em menos de uma década, a geração X estará com 50 anos ou mais e alguns em vias de se aposentarem!

Faz-se necessário refletir sobre diferentes variáveis que podem em diversos graus influenciar o ambiente organizacional e como deve-se dar a inserção das novas gerações nas empresas:

  • Até que ponto a situação do colaborador não é uma resultante de como se dá a liderança por parte dos gestores ou mesmo a sua ausência de princípios de liderança coesos e orientados ao capital humano de que dispõem;

  • Da mesma forma que as empresas tiveram que se adaptar as mudanças no perfil dos consumidores, elas precisam ver que essas mudanças também ocorreram com seus funcionários e que também são consumidores. Isso acaba refletindo-se nos planos de incentivos, nos relatórios e nas avaliações, nos treinamentos e programas de capacitação, nos procedimentos operacionais padrão e até nos programas de cargos e salários;

  • Consequência imediata do item acima, a percepção do que é qualidade de vida no trabalho (QVT), também é diferente;

  • Aspectos que no passado eram muito mais discurso de Marketing, precisam de fato ser reais no quotidiano da empresa, como a inovação e a mudança permanente, tecnologia, valorização da responsabilidade social, para citar apenas os mais comuns;

  • Gestores precisam ser flexíveis e assumir a necessidade de mudanças. Suas práticas de gestão de pessoas precisam evoluir para novos públicos;

  • O papel do departamento de Recursos Humanos ganha ainda maior importância e que entre outras coisas precisa ajudar a mudar a cultura organizacional em adequação com novos tempos;

  • Esperar e investir vários ou mesmo alguns anos por uma promoção ou algo que reflita-se em reconhecimento profissional, não é certamente uma opção para a maioria dos que fazem parte dessas gerações;

  • Não há como esperar um conjunto de hard e soft skills que se tinha como ideal há 20 anos atrás – ou menos até – desses profissionais. Em vez disso, é preciso saber tirar proveito do novo arsenal de habilidades e talentos que essas gerações oferecem;

  • Comunicação empresarial falha ou ineficiente. Todos os níveis sofrem e as consequências negativas são na proporção direta da sua qualidade. Promover sua eficácia, passa necessariamente por senão eliminar, diminuir o abismo que existe e que separa diferentes gerações em termos comunicativos;

  • Enganam-se redondamente os gestores e empresários que ao supor que as gerações que vivem e relacionam-se por meio das aplicações na Internet e nas redes sociais, não valorizam o aspecto humano. Ao contrário e justamente por isso, que a responsabilidade social e ambiental lhes é ainda mais importante. Empresas que valorizam efetivamente a pauta ESG, tendem a atraí-los mais.

Em outras palavras, o quiet firing ou a demissão silenciosa por parte do colaborador não é algo que ocorre simplesmente porque é da natureza dos colaboradores das novas gerações, ou porque são preguiçosos, ou desinteressados e desmotivados, mas porque o ambiente e as condições de trabalho os “empurram” nessa direção.

Por que evitar o quiet firing?

Nenhuma das duas situações discutidas até aqui, é favorável, mas a ocorrência do quiet firing revela consequências ainda mais severas para a empresa.

Antes de mais nada, é preciso deixar claro que algumas vezes não faz parte da cultura ou não é uma política da empresa agir assim. Acontece como vimos, por inabilidade dos seus gestores na condução do capital humano ao seu dispor.

Ou seja, a alta cúpula imagina que não aconteça, mas desconhece que diante da falta de habilidades de liderança, as circunstâncias propícias são criadas.

Um colaborador que confia em seu gestor imediato, é propenso a acreditar que suas ações visam seu bem-estar. Mas confiança é algo que não se pede e não se impõe. É resultado das ações do gestor. Quando ocorre de modo orgânico, diz-se que ele exerce um dos aspectos da liderança.

Também é preciso ter ciência que a empresa precisa evoluir de acordo com o mundo, sendo ou buscando as soluções que se espera na sociedade da qual faz parte e que envolve segurança, inclusão, ética, educação, distribuição de renda, os princípios da agenda ESG, etc.

Mas quando o quiet firing está inserido habitualmente e conscientemente nas práticas da empresa, tem-se uma situação mais severa e que pode ter consequências ainda mais críticas.

Não esqueçamo-nos que há jurisprudência e entendimentos a respeito. A cartilha de Prevenção ao Assédio Moral do Tribunal Superior do Trabalho (TST) prevê uma série de situações, como a exposição a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente de trabalho, bem como a reiteração permanente, representa danos à dignidade e à integridade do indivíduo e à saúde física e mental.

Para além dessas questões, há outras relevantes:

  • As situações e/ou o ambiente inadequados, serão propícios e podem “contaminar” também aqueles que supostamente têm o perfil certo, os mais produtivos e mais motivados. Se as demais pessoas veem determinadas atitudes sendo tomadas contra seus pares ou outros colaboradores, independente do nível hierárquico que ocupem, elas saberão que o mesmo pode aplicar-se em algum momento a elas mesmas;

  • Empresas em que o quiet firing – mas mesmo o quiet quitting – ocorre, tendem a ter elevada rotatividade (turnover) de pessoal, com sabidas consequências negativas, como queda na produtividade, na busca por padrões, em constantes treinamentos, aumento do absenteísmo, em custos e que até mesmo compromete a retomada da atividade econômica das empresas no pós-pandemia;

  • A comunicação em todos os níveis, tende a se deteriorar. É importante lembrar que muitas vezes a precariedade da comunicação também é causa e, portanto, quando se tem isso, a empresa entra em um círculo vicioso;

  • Coibir e principalmente caminhar na direção oposta do quiet firing, é trabalhar em prol de um clima organizacional mais positivo, com ganhos consistentes e que se aproxima do tão objetivado colaborador que “veste a camisa da empresa”;

  • Além da mentalidade da sua direção, uma empresa é resultado também das pessoas que ajudam a mantê-la em pé, a funcionar e que envolve todos, não importando o seu nível hierárquico ou posição no organograma.

De silenciosa, essa situação só tem o nome.

Na verdade, é um eloquente alerta do quão urgente é preciso repensar tudo o que é feito, por que é feito e quais os impactos na continuidade dos negócios.

Já passou do tempo e da visão ultrapassada de que por dar emprego e um salário, as pessoas se sujeitarão a qualquer coisa, vide os números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), pelos quais nos últimos 12 meses, encerrados em julho/2022, houve mais de 6 milhões de pedidos de demissão entre os trabalhadores com carteira assinada, representando cerca de um terço do total de desligamentos no mesmo período.

As pessoas não estão simples e silenciosamente abrindo mão ou desistindo dos seus empregos, mas buscando mais do que seus pais esperavam de um, como equilíbrio com sua vida pessoal e seus ideais e convicções.

Por fim, mas não menos importante, é importante perceber que apesar das diferenças entre os termos abordados, muitas vezes as causas são as mesmas e que por isso não é possível tratar de apenas um ou apenas o outro isoladamente. Visto de outra forma, são duas faces de um mesmo problema.

Conclusão

Quiet firing e quiet quitting, são dois lados de uma mesma moeda, que se não compreendidos em sua extensão, podem trazer impactos severos para as empresas.

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