O papel da empresa na inclusão social, importância e como fazer
Sua empresa é uma ilha ou parte de um todo?
A reflexão produzida por essa pergunta, serve como ponto de partida para o tema desse post.
Pode haver muitos desdobramentos ao tentarmos responder de modo amplo, mas vamos nos concentrar em uma questão que se faz importante e que é o papel da empresa nas cada vez mais necessárias políticas de inclusão social, em um mundo tomado por desigualdades e discriminação.
O que é inclusão social?
Inclusão social é garantir por meio de um conjunto de ações, que os cidadãos possam participar de todas as esferas da vida em sociedade, independente de características como classe social, etnia, idade, gênero, ou quaisquer outras que os diferenciem da maioria ou do que é tido como padrão.
Sabe-se que nos mais diferentes círculos sociais, a participação das pessoas não ocorre de modo representativo da composição demográfica. Ou seja, se em termos médios temos 52% de mulheres e 48% de homens na população brasileira, a mesma proporção deveria ser observada no quadro de funcionários das empresas, para citarmos apenas um desses círculos nos quais estamos inseridos.
Esse mesmo raciocínio deve ser aplicado quando consideramos os outros aspectos que diferenciam as pessoas e que algumas vezes funcionam inversamente, ou seja, segredando-as.
Exemplos de ações que visam a inclusão, são as cotas raciais para universidades, inserção de profissionais negros na administração pública, inclusão de pessoas com deficiência (PcDs) no mercado de trabalho, sendo que no caso desta, há até uma lei (Lei Nº 13.146, de 6 de Julho de 2015), mais conhecida como a Lei Brasileira da Inclusão Social (LBI), que visa assegurar-lhes uma participação mais ativa na sociedade e combater a consequente discriminação.
Todavia, há pelo menos dois aspectos que devem ser destacados.
O primeiro, é que o universo das pessoas com deficiência, não se restringe àqueles com limitações de ordem física ou motora notável ou acentuada. Segundo o IBGE, 19 em cada 100 brasileiros podem ser classificados com deficiência visual, mas “apenas” 3 deles com deficiência visual total ou com grande dificuldade para enxergar.
Em outras palavras, a deficiência não necessariamente precisa ser destacadamente aparente para ser classificada como tal.
O segundo, que inclusão social e diversidade não são sinônimos.
Qual é a diferença entre diversidade e inclusão social?
Garantir que na empresa ou em um outro círculo social qualquer, exista mais ou menos as mesmas proporções de pessoas conforme a representação demográfica, como faixas etárias, diferentes etnias, os gêneros ou a presença de deficiência, não é indicativo de que se está promovendo a inclusão social.
Isso é garantir diversidade.
Passa a ser inclusão, quando as mesmas proporções também atingem cargos de maior nível hierárquico e nível de remuneração, por exemplo.
Quando você tem ocupando um mesmo cargo, números equivalentes de homens e mulheres, mas as mulheres recebem em média 20% menos, você tem diversidade, mas há desigualdade de gênero.
Esse tipo de disparidade acontece não só entre homens e mulheres.
Se não é dado o mesmo nível de oportunidades em toda e qualquer situação a algum grupo, não se pode dizer que o ambiente é inclusivo. Ao contrário, há algum tipo de discriminação velada, encoberta, oculta.
Qual a importância da inclusão social nas empresas?
Já não é de hoje que pautas como responsabilidade social e agenda ESG fazem parte do posicionamento e das políticas de empresas dos mais diversos segmentos e portes.
Não há como falar em qualquer um desses temas e deixar de fora a inclusão social, afinal uma empresa que tem pretensão de ser responsável do ponto de vista social, não o fará de modo coerente e completo, se não tiver em seus quadros de funcionários, pessoas tão diversas quanto aquelas presentes na sociedade da qual faz parte.
Objetivamente, há uma série de outras justificativas…
Identificação e representatividade com os clientes
Um dos pontos primordiais e de grande relevância, é a identificação e a representatividade junto aos seus clientes.
O cliente que recebe atendimento, que vê na gerência do estabelecimento e que sabe que a empresa tem nos diversos níveis do seu quadro funcional, pessoas como ela e dos mais diversos grupos, primeiro se vê representada.
Mas também vê com maior simpatia as marcas que vão além do discurso e dão oportunidades àqueles que muitas vezes são discriminados por outras empresas. Isso gera identificação, sobretudo, porque o próprio cliente não raras vezes é segregado, sofre preconceito e outras situações indignas, por pertencer ao mesmo grupo.
É também um fator de promoção da confiança do cliente na marca.
Melhor imagem perante o mercado
O mercado – consumidores em geral, fornecedores, concorrentes, acionistas – de um modo geral tendem a avaliar de modo mais positivo a marca que pratica inclusão social.
Há várias associações positivas que decorrem do fato:
-
Deduz-se que a empresa tem uma visão e administração moderna;
-
A marca é desprovida de preconceitos e estereótipos;
-
Sabe o que é e promove a empatia;
-
Está em sintonia e coloca em prática o que defende;
-
Faz sua parte no processo de justiça social;
-
Denota um comportamento ético;
-
Contribui para uma sociedade mais igualitária.
Atração de talentos
Em termos de mercado de trabalho, a atração e a gestão de talentos também são dois fatores favorecidos.
Com um universo mais amplo de pessoas à disposição, que não são postas de lado em função de pertencerem a um grupo, é mais fácil encontrar as aptidões necessárias.
Além disso, os candidatos sentem-se mais motivados por saberem que outros fatores para além da sua experiência, sua capacitação e suas habilidades, não terão qualquer nível de influência na sua admissão.
Qualidade de vida no trabalho
Um ambiente plural e tão representativo quanto possível da realidade, também é favorável ao desenvolvimento de relações interpessoais mais autênticas, mais ricas, mais humanas e equilibradas.
Soma-se a isso o fato de que a organização que entende e cumpre o seu papel inclusivo, tende a valorizar o seu capital humano de que dispõe, promovendo ações e políticas que culminam em melhor qualidade de vida no trabalho.
Pluralidade dos recursos humanos
A pluralidade ou a diversidade dos recursos humanos acarreta outros benefícios:
-
Quanto mais pessoas de realidades diferentes, maior a visão de mundo se produz;
-
Mais aprendizados e experiências mais ricas, favorecendo o “pensamento fora da caixa” e a quebra de paradigmas;
-
Desenvolvimento da tolerância e do respeito pelo diferente;
-
Melhor entendimento do universo de clientes externos e que encontram-se representados pelos clientes internos e que assim como eles, também são diversificados e têm necessidades diferentes;
-
Ambiente mais propício à empatia, uma vez que a diversidade traz o aprendizado das dificuldades vividas pelos grupos que representam.
Justiça social
Como parte da sociedade e só sendo possível desenvolver-se de modo sustentável, duradouro e consistente em um ambiente equilibrado, cabe também às empresas fazerem sua parte no processo de busca pela justiça social, a qual caracteriza-se pela igualdade de direitos e deveres entre todos os cidadãos, o respeito às diversidades culturais, a promoção do desenvolvimento social e o acesso à educação, à saúde e ao trabalho.
Em outras palavras, justiça social está relacionado com as desigualdades sociais e os problemas que essas diferenças – cada vez mais acentuadas – produzem, como a pobreza, a violência, a fome, as questões sanitárias, etc, e as ações que precisam ser adotadas para resolvê-los.
Para além do papel e da responsabilidade do Estado, está nas mãos das empresas parte importante da solução, que é prover trabalho, renda e como consequência dignidade a uma parcela da população.
Inserida em uma sociedade com maior justiça social, as empresas participam de um ambiente mais saudável e propício ao seu próprio desenvolvimento.
Como promover a inclusão social na empresa?
Não há uma receita única e tampouco é algo que se implanta por “decreto”.
É um processo longo e contínuo e que envolve a cultura da empresa e todos os departamentos, a começar pelos recursos humanos.
Lamentavelmente e por paradoxal que pareça, o Brasil ao mesmo tempo em que é uma nação que tipicamente representa a pluralidade, é também marcada pelo desrespeito aos direitos dos diferentes, por discriminação e preconceitos.
Assim, o primeiro passo é um trabalho de esclarecimento, de conscientização e de conhecimento. A extensão e intensidade desse trabalho, está justamente dependente da cultura e do capital humano que já integra a empresa.
Superar os preconceitos e a discriminação e suas manifestações, como a misoginia e o machismo, o racismo, a xenofobia, a homofobia, entre outras manifestações de mazelas estruturais que estão arraigadas ao longo de gerações, é um dos maiores desafios para a promoção não só da diversidade, mas da efetiva inclusão social.
1. Contratação de pessoas
Conforme observamos no artigo sobre como contratar a pessoa certa, os critérios observados devem ser exclusivamente técnicos e não subjetivos.
É preciso concentrar-se apenas em hard skills e soft skills. Nada além disso.
Algumas vezes a definição de perfil para uma vaga nem mesmo leva em consideração o preconceito ou estereótipo, mas é fundamentada em paradigmas e crenças de como as coisas devem ser. Baseado em velhos conceitos e que as vezes nunca foram questionados, tradicionalmente empresas contratam para o cargo de promoção de vendas, mulheres. Por que?
Mais do que isso, em pleno século XXI, não é raro vermos anúncios de vagas que colocam fatores limitantes, como “buscamos profissionais de até 25 anos” ou pior ainda, “com boa aparência”. O que significa ter boa aparência? Quais os critérios são utilizados para determinar o que é boa aparência?
Sendo assim, o primeiro passo é dado justamente no processo de abertura da vaga e determinação do perfil e em um segundo momento, no processo seletivo propriamente dito, que consiste de entrevistas, testes, dinâmicas e tudo o mais necessário.
2. Integração e treinamento
Por mais que algumas vezes uma empresa tente fazer sua parte, contratando pessoas as mais diversas, quando elas iniciam nessa nova etapa, as coisas não transcorrem adequadamente.
As razões podem ser muitas e diferentes, mas em algumas das vezes, deve-se à ausência de um trabalho de integração dos novos colaboradores (onboarding) e falta de treinamentos.
Mesmo para um funcionário que seja pertencente a um grupo majoritário, a integração é essencial. Mas no caso de alguém que não é, pode ser bastante difícil.
Imagine uma pessoa LGBTQIA+ em seu primeiro dia em uma empresa cujos demais funcionários sejam predominantemente homens. Há razoáveis chances de situações não desejáveis, se tudo o que abordamos até aqui não for feito com seriedade e com um acompanhamento profissional.
Não deveria ser necessário, mas a realidade é outra.
Quanto aos treinamentos, também são fundamentais, mesmo para aqueles que já desempenhavam função igual em outra empresa, mas é ainda mais importante nos casos em que não ou quando há fatores limitantes, como por exemplo, portador de deficiência.
3. Teletrabalho, home office e regime híbrido
O teletrabalho ou home office, bem como o regime híbrido, em que o colaborador atua tanto presencialmente como remotamente, pode ser uma solução para alguns dos possíveis entraves ou dificuldades.
Especialmente nos casos de pessoas com deficiência e que dependendo do grau de necessidades especiais apresentado, requer mudanças para tornar o ambiente acessível, essa pode ser uma solução, partindo-se do pressuposto que o colaborador tenha um ambiente adaptado e que possa ser usado para essa modalidade de trabalho.
Também no processo de integração, o regime híbrido pode ser indicado como parte de um processo paulatino de adaptação.
Mas cuidado! Nunca deve ser a “solução” para isolar fisicamente grupos devido às suas diferenças. Isso é contrário a tudo o que defendemos até aqui e não é inclusão!
Tudo deve ser feito estritamente com o objetivo de oferecer qualidade de vida no trabalho.
4. Implantar o combate à discriminação
Não só porque está previsto em lei, mas porque a organização compreende que é parte do processo, é preciso instituir políticas e instrumentos para que a discriminação não ocorra.
O RH deve incluir em seu planejamento, ações que visam a difusão do respeito mútuo, da convivência harmoniosa, da aceitação e colaboração, da eficácia da comunicação, da valorização profissional e da empatia, culminando em um clima organizacional favorável e saudável.
Passa também por assegurar que todos os colaboradores têm iguais condições aos benefícios, bonificações, planos de incentivo, acesso à programas de capacitação, treinamento, educação continuada, planos de carreira e promoções.
As avaliações de desempenho, devem considerar apenas métricas objetivas, bem definidas e conhecidas por todos
Por fim, mas não menos importante e pelo contrário, é altamente desejável que exista um canal de comunicação entre colaboradores e empresa, por meio do qual os funcionários possam relatar quaisquer situações que tenham sido constrangidos, discriminados ou seus direitos tenham sido violados, por parte de outros colaboradores, não importando seu nível hierárquico.
Conclusão
O papel da empresa na inclusão social vem ganhando cada vez mais importância, em um mundo que precisa diminuir desigualdades e acabar com a discriminação.