Fidelização de clientes existe mesmo?
Desde que os primeiros conceitos de Marketing surgiram e foram colocados em prática, lá nos idos da década de 1950, também começou-se a falar em fidelização de clientes e esse tem sido uma das suas tarefas mais desafiadoras.
A pergunta que gera a nossa discussão de hoje, é: “Existe mesmo fidelização de clientes?”
Sim, porque muito é falado a respeito como se fosse algo razoavelmente simples e ao alcance de praticamente qualquer marca. Mas é mesmo? Ou os clientes são fiéis às vantagens que eles têm? Ou talvez seja apenas discurso para vender conteúdos, livros e cursos sobre o tema?
Vamos falar mais a respeito?
O que é fidelização de clientes?
Supostamente todo mundo sabe o que é fidelização de clientes, mas responder a pergunta não é propriamente nosso objetivo, mas refletir melhor sobre, o que será de valiosa importância mais a frente.
Quando buscamos sobre fidelidade nos dicionários, encontramos uma variedade de significações de acordo com os possíveis contextos nos quais o termo pode ser usado:
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Manter-se próximo e alinhado com o objeto do que se é fiel;
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Característica de quem confia e é leal;
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Revela zelo e dedicação pelo que se é fiel;
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Tem laços afetivos e em função deles, não é capaz de trair;
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É honesto com algo ou alguém;
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Que demonstra respeito na exata reprodução em relação ao autêntico ou original;
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Tem fé e acredita em alguém ou algo.
Ou seja, fidelidade não é uma condição única, mas de vários aspectos, mas que normalmente quando relacionada com os clientes de uma marca, costuma ser apenas sinônimo de retenção dos clientes conquistados.
Fosse assim, seria razoavelmente simples mantê-los “fiéis”, como por exemplo, concedendo descontos, por meio de promoções, brindes, para citar o que muitos já fazem rotineiramente.
Mas não é só isso, contrariamente ao que alguns equivocadamente defendem, pois bastaria que a concorrência também fizesse, o que por si só já põe por terra o conceito.
A fidelidade – tal como na relação entre duas pessoas – só se caracteriza quando apesar dos flertes por parte de um terceiro, das tentações ou das oportunidades que se apresentarem e até dos eventuais desentendimentos e insatisfações que podem e vão ocorrer, o cliente mantém sua relação de exclusividade com a marca.
Na verdade, diferente das relações amorosas, ele – o cliente – pode até experimentar ocasionalmente alguma outra marca, mas apenas para ter certeza de que sua escolha é de fato a mais acertada, ou talvez como comparação, ou ainda porque diante de um fator alheio à sua vontade, como diante da escassez ou falta do produto, ele foi obrigado a recorrer a uma marca diferente.
Em linhas gerais, clientes fiéis, não se deixam seduzir facilmente pelas marcas concorrentes. Na hora de colocar o produto no carrinho do supermercado, às vezes nem comparam os preços, não dão bola para a promoção de vendas da marca concorrente e tampouco para a oferta leve 3 e pague 2.
Uma vez compreendido o cenário típico e o que é a fidelização, vamos ao que a maioria quer saber…
O difícil caminho da fidelização de clientes
Contrariamente ao que a maioria faz parecer, a verdadeira fidelização de clientes e não apenas a retenção de clientes, consiste de um caminho longo e não tão fácil de ser percorrido.
O que não deve ser motivo de desistência, primeiro porque traz benefícios mais compensadores do que os esforços feitos e em segundo, porque quanto melhor for conduzido o processo, mais próxima a marca estará de ter fãs, o que é um estágio além da fidelização.
1. Conheça seu custo / preço
O primeiro passo rumo a fidelização, é entender que ela não deve ser feita a qualquer custo / preço.
Essa compreensão tanto significa que não vale tudo para conquistar clientes que hoje são fiéis às marcas concorrentes, porque pode ser muito custoso financeiramente falando e porque pode não valer a pena.
Sim, embora em um primeiro momento possa até soar estranho, ter uma bela fatia do market share pode ser bem mais saudável para a marca, do que ter todo o mercado. Mas essa é outra discussão.
Por mais filosófico que possa parecer inicialmente, é a concorrência que faz uma marca crescer. Pense que qualquer pessoa que tenha duas ou mais opções, faça sua escolha após um processo de comparação. Desde que o resultado dessa comparação não tenha sido um empate, cujo critério final tenha sido o preço.
Da constatação acima, surge naturalmente o segundo passo…
2. Descubrir o(s) seu(s) diferencial(is)
Se sua marca não tem ao menos um fator que claramente consiste de um diferencial em relação às demais, vencerá aquela que tiver o menor preço.
Em outras palavras, quanto maior for o equilíbrio entre as características e os respectivos benefícios de um mesmo produto, de diferentes marcas, o fator responsável pela escolha tende a ser o preço, pelas promoções oferecidas, pelos brindes e ate pelos “planos de fidelidade” e que no final, também significam preço, afinal tudo isso tem um custo para a marca.
Por outro lado, quanto mais marcante e evidente for o diferencial sob a ótica do cliente, mais ele se dispõe a pagar.
Exemplos não faltam para justificar essa afirmação, como a dona de casa no supermercado ou no shopping center e que desde que ela possa pagar, não entram na sua sacola só as marcas mais baratas.
Aliás, é bastante comum entre as mulheres, que o preço seja um dos últimos – senão o último – fator a ser considerado, desde que o produto em questão esteja alinhado com o que ela espera dele. Muitas estão dispostas a fazer verdadeiros sacrifícios para terem o que julgam que lhes atende.
3. Pessoas são mais fiéis a outras pessoas
A veracidade da afirmação acima é comprovável pelos clientes quando em contato com uma empresa, dão preferência a um atendente ou vendedor em específico.
As razões podem ser muitas e as mais variadas, como por que o vendedor já conhece seus hábitos, desejos e necessidades, como porque as experiências de atendimento foram personalizadas, por que ele é atencioso e gentil, ou até porque há simpatia mútua.
Seja qual for o motivo, o atendente ou vendedor é o representante humano desse ente abstrato chamado marca. É bem mais fácil ter algum sentimento por alguém, do que por algo.
E sabendo disso, além de outras razões, que as empresas que cada vez mais automatizam seus processos de atendimento, preocupam-se em criar mascotes, avatares com aparência simpática de pessoas, dar nomes reais ou até apelidos aos assistentes virtuais inteligentes.
É uma tentativa de emprestar um caráter mais humano ao atendimento digital, ou de pelo menos fazer com que as pessoas se sintam menos tolas em falar com uma máquina.
Independentemente da eficiência desse tipo de ação, é fato que aquelas que ainda valorizam verdadeiramente o fator humano, especialmente nas relações com as gerações mais velhas e os nativos analógicos, estão um pouco mais próximas de conquistar alguma lealdade.
Mas há também – e não deve ser esquecida – a questão da familiaridade com a tecnologia. Basta observar a composição etária das filas de autoatendimento e das que ainda têm um atendente, naquele famoso fast food de hambúrgueres.
4. Conquista da confiança
Impossível dissociar fidelidade de confiança, tanto na relação entre pessoas, quanto delas para com as marcas.
Logo, também é impensável qualquer política visando fidelizar clientes, que primeiro não tenha como um dos seus pilares, conquistar a confiança dos clientes.
E confiança vem com o tempo e como consequência de uma série de fatores:
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Ser honesto, transparente, ético e entregar o que é prometido;
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Respeito aos concorrentes e aos clientes;
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Assumir suas responsabilidades, não terceirizar a culpa e resolver seus eventuais problemas;
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Ter padrões, organização e qualidade nos produtos / serviços;
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Atendimento efetivamente orientado ao cliente;
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Constituição e manutenção de relacionamento.
5. Qualidade de produtos / serviços
O real e amplo significado da palavra qualidade vem sendo banalizado ao longo do tempo.
Costuma-se dizer que o que tem qualidade, é bom. Mas esse adjetivo pode assumir diferentes gradações e, portanto, um produto pode ser classificável quanto à qualidade em uma escala de 0 a 10, ou quem sabe ser péssimo, ruim, regular, bom ou ótimo.
Quem nunca ouviu que “qualidade desse produto, é péssima!”?
Mas acima de tudo, o nível dessa qualidade deve importar sob o ponto de vista do cliente, o qual pode – e somente ele pode – determinar se é bom ou não por conta do quão durável é, se o seu uso é simples ou não, o quanto ele atende de sua função primária.
Mas pode ser também resultado dos três aspectos combinados.
Portanto, o nível de qualidade de um produto / serviço não é algo determinável pelo Marketing da marca, mas é constatação do usufruto do produto / serviço por parte do cliente.
E não é demais destacar sua importância no processo de conquista da confiança (4º passo) e em possível fator de diferenciação (2º passo).
6. Pessoas são pessoas
Essa obviedade revela que fidelizar uma pessoa pode ser um verdadeiro desafio, dado o universo contido na natureza humana. Mas também é um alerta para um ponto frequentemente negligenciado ou não tratado com a devida importância, o público-alvo ou a persona.
Por mais que ninguém seja igual a ninguém, há sim pontos e interesses em comum e que devem ser levados em consideração, sem o que não faz sentido em falar em diferenciação, por exemplo. Afinal, o que pode ser um diferencial para uns, pode ser totalmente irrelevante para outros.
Há quem compre carros pela tecnologia embarcada e pela confiabilidade mecânica. Mas há quem faça sua escolha pela estética, como há também pelo preço e até pelo status que a marca confere ao seu proprietário. Como há quem prefira um atendimento totalmente digital e quem só recorra aqueles em que existe uma pessoa de carne e osso do outro lado.
7. Pessoas são fiéis a elas mesmas
Clientes primeiro são fiéis a eles próprios, aos seus bolsos, ao seu bem-estar e aos seus princípios.
Nesse passo, a marca precisa estar atenta a esse conjunto de aspectos e que significa que deve atender ao maior número possível de necessidades fundamentais e básicas, de desejos e expectativas.
Implicitamente é um pouco do que já tratamos, como a qualidade e diferenciação, mas envolve fatores que até pouco tempo não eram tão valorizados.
Pode ser a marca que além de entregar produtos de reconhecida qualidade, também tem preocupação ambiental, responsabilidade social e tem um conjunto definido de políticas de governança, a conhecida pauta ESG.
A atuação da empresa, seus valores e princípios, são cada vez mais importantes e precisam de fato estar alinhados com os dos seus clientes e não ser mais apenas discurso ou parte de um conteúdo que ninguém lê na página “quem somos” do material institucional da marca.
Outro exemplo dessa mudança de paradigma, são as empresas veganas, que basicamente garantem que na cadeia produtiva dos seus produtos, não há nada de origem animal, nem tampouco qualquer processo que signifique exploração ou sofrimento aos animais, como testes feitos neles, por exemplo.
Elas estão de olho em um segmento que estima-se que já seja de mais de 30 milhões de pessoas (15% da população) só no Brasil.
Boa parte desse público está disposto a abrir mão de marcas que teoricamente entregam mais, pagando menos, mas em nome de um valor que para eles é inestimável.
8. Depende de relacionamento
Tal como é com a confiança, não faz sentido falar em fidelidade sem relacionamento.
Nenhuma empresa consegue implantar uma estratégia eficiente de fidelização de clientes, se não estiver disposta a investir em Marketing de Relacionamento, por razões que deveriam ser óbvias para todos.
O segundo grande problema, é que algumas das marcas que reconhecem que o relacionamento é essencial, não o praticam da forma correta. Não é apenas estar nas redes sociais, fazer uma pesquisa de satisfação e outra para identificar o Net Promoter Score e entupir a caixa de entrada dos clientes com e-mail Marketing desinteressante.
Lições de como sair do lugar-comum, não faltam. Está na hora de ser criativo e realmente se interessar pelo cliente. Sim, porque o que a maioria vem fazendo, transparece apenas que tem como finalidade vender mais, ou visto pelos olhos do cliente, uma forma de tirar um pouco mais do seu dinheiro.
Conclusão
Fidelização de clientes pode ser uma ilusão ou uma realidade, dependendo de como a marca trata fundamentos essenciais para a maioria dos consumidores.