O que é etarismo nas empresas e como lidar com ele?

A frase “a vida começa aos 40” já foi título de livro, de filme, de peça de teatro, de música de John Lennon e até de campanha publicitária, mas atualmente tem sido reescrita como: “A vida termina aos 40!”.

Pelo comportamento de muitas pessoas e de como as empresas tratam essa grande parcela da população, o que foi um lema amplamente propagado, em um passado não muito distante, no máximo tem sido motivo de piada e de risadas.

O que está por trás disso, é o etarismo e que está cada vez mais escancarado na sociedade e naturalmente, nas empresas também.

O que é, quais as suas consequências e quais as soluções para o etarismo, é a nossa discussão de hoje.

O que é etarismo?

Costuma-se definir etarismo como sendo a discriminação ou o preconceito em relação a uma pessoa, com base na sua idade e que geralmente recaí nas de maior idade. Não raramente é também chamado de idadismo ou ageísmo.

A discussão sobre o tema ganhou importância a partir de dois episódios recentes e que viralizaram na Internet.

No primeiro, ainda no ano de 2022, Carlos Augusto Luchetti Junior, de 45 anos, por um erro interno de uma empresa de RH, recebeu como resposta a um processo seletivo ao qual ele havia submetido seu currículo: "Cancelaaaaaaaa, passou da idade".

Obviamente que o “parecer” da responsável pela seleção deveria ser apenas interno, mas por um descuido, chegou ao Carlos Augusto e revela o pensamento da recrutadora – e possivelmente da empresa que estava contratando – em relação às pessoas com idade igual ou maior que Carlos Augusto. São velhas demais!

No outro, em março de 2023, três estudantes do curso de biomedicina em uma faculdade de Bauru (SP), gravaram e publicaram em uma rede social, um vídeo não para elogiar e mostrar admiração, mas para debochar de uma colega de curso, a Patrícia Linares, por ela ter “40 anos já” e que “era para estar aposentada”.

Na verdade, Patrícia completou 45 anos, dias depois do lamentável vídeo.

Os dois eventos escancaram o estereótipo associado à idade e que em ambos os casos, nem são rigorosamente de pessoas consideradas idosas e que pelo conjunto de leis brasileiras, estipula aquelas acima dos 60 anos.

Ainda que fossem idosos, não deveria ser motivo desse tipo de tratamento, no mínimo desumano.

A sensação que se tem, é que essas e outras demonstrações preconceituosas, significam que ao atingir determinado patamar etário, atinge-se também uma condição debilitante ou incapacitante e que as pessoas a partir de alguma idade, não têm mais direito à muitas das situações da vida, entre elas o trabalho.

Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) mostram que a fatia de pessoas acima dos 30 anos representa 56,1% da população e 26% da população brasileira tem mais de 50 anos, mas até 2040, 57% da força de trabalho terá mais de 45 anos.

Perante essa mentalidade, quase 1 em cada 4 pessoas hoje e 6 em cada 10, daqui a 17 anos, devem ter o fim de suas vidas decretado, incluindo alguns que hoje integram essa corrente que tem comportamento discriminatório.

Como se manifesta o etarismo?

O etarismo se manifesta de diversas formas, como nos dois casos que viralizaram na Internet recentemente e que em sua origem deveriam ser apenas “brincadeiras sem consequências e inocentes”, como em outras frases ditas e ouvidas repetidamente, com grande naturalidade:

A senhora está bem conservada para sua idade. Nem parece a idade que tem...
Nessa idade e ainda trabalhando?
Parecia um museu. Só tinha velho

Há quem diga coisas assim rindo e provocando risos, sem se dar conta das consequências e do que há por trás de pensamentos como esses.

A verdade é que há paradigmas consolidados a respeito, segundo os quais, as gerações mais velhas são questionados quanto à sua capacidade de adaptarem-se à transformação digital, de acompanharem as inovações do mercado em que atuam, de manterem-se atualizados, são pouco produtivos e também menos flexíveis e versáteis.

Há vezes até em que o preconceito é explícito, quando se vê um anúncio de vaga de trabalho, no qual entre os requisitos, consta explicitamente um limite de idade.

Idade inclusive é cada vez mais uma das características que compõe o perfil de uma vaga e tem sido tão determinante – ou até mais – do que o conjunto de hard e soft skills do candidato.

Muitos – senão a grande maioria – são preteridos, independente do seu histórico profissional, das suas habilidades e aptidões. A idade não está dentro do limite estipulado? Candidato automaticamente descartado!

Por que o etarismo deve ser combatido?

Permitir que o etarismo seja institucionalizado, produz consequências em diversas esferas.

O etarismo institucional refere-se às leis, regras, normas sociais, políticas públicas e privadas, que limitam as oportunidades e prejudicam direta ou indiretamente um cidadão em função da sua faixa etária.

É fácil observar como esse preconceito está arraigado e como se manifesta.

Em 2021, o deputado Martins Machado (Republicanos) apresentou um Projeto de Lei (PL 2256/2021) que propunha a mudança do pictograma (sinalização indicativa em vagas, assentos, filas, e outros que prestem serviços prioritários aos idosos) representativo do cidadão idoso e que até então consistia de uma pessoa curvada e portando uma bengala, para uma pessoa ereta e com a inscrição “60+”.

Segundo o Projeto de Lei, a imagem é pejorativa, é desrespeitosa e institucionaliza o etarismo

Assumir determinadas condições em função da idade, não é prudente. O mesmo conjunto de estereótipos com base em idade, pode impedir, por exemplo, um profissional mais jovem de assumir um cargo de liderança, sob a justificativa de que lhe falta experiência, ou que talvez não tenha a maturidade necessária para assumir as responsabilidades que o posto exige.

O etarismo restringe e limita as pessoas obrigatoriamente a papéis únicos e definitivos. É tão preconceituoso quanto assumir condições em decorrência da etnia, da cor da pele, do gênero ou de qualquer outra característica.

Uma pesquisa conduzida pela plataforma de vagas Infojobs, junto a profissionais acima dos 40 anos, revela uma dura e preocupante realidade:

  • 70,4% dos profissionais acima dos 40 anos, afirmam que já sofreram preconceito etário durante processos seletivos;

  • 78,5% deles disseram que o mercado de trabalho não dá as mesmas chances para profissionais 40+, quando comparado com os mais jovens;

  • 68,4% alegam que muitas vezes estar atualizado, não basta.

A restrição em função da idade, é o mesmo que excluir gradativamente do convívio em sociedade e começa quando se perde o emprego ou oportunidades de trabalho por ter atingido determinada faixa etária. O indivíduo nessas condições, não raramente se vê em uma situação de baixa autoestima, de alienação e até de desamparo.

Não faltam estudos que apontam que casos de depressão em idosos, costumam estar relacionados com o fim de sua vida profissional.

Ou seja, em tempos nos quais a pauta ESG é cada vez mais um fundamento básico, o “S” e que representa a responsabilidade social que as empresas precisam ter, deve ser praticado primeiramente dentro das próprias organizações.

Como combater o etarismo nas empresas?

O combate ao etarismo, é antes de mais nada um aspecto da cultura e da filosofia das empresas e manifesta-se nas suas políticas internas, como na gestão de talentos, nas políticas de cargos e salários, nas formas como são conduzidas as promoções de funcionários e, sobretudo, nos processos seletivos e sua administração pela área de Recursos Humanos.

Temos inclusive um artigo que trata de forma mais ampla como agir no atual momento, no qual há diferentes gerações no mercado de trabalho e como lidar com essa realidade.

Em termos mais práticos, há uma série de medidas que podem e devem ser adotadas para combater o etarismo na empresa:

  • Revisar as políticas de definição de cargo – que são o ponto de partida para contratação – e assegurar-se que não existam fatores limitantes relacionados com idade;

  • Instituir programas de mentoria e coaching, nos quais os mais jovens podem ter compartilhado e aprender aquilo que só a vivência e a experiência dos menos jovens proporciona;

  • Criar e manter programas de capacitação, reciclagem, treinamentos, educação corporativa e continuada, de modo que todos possam adquirir os conhecimentos necessários ao desempenho adequado de suas funções;

  • Desde o processo de integração de novos colaboradores (onboarding), independente da faixa etária a qual pertençam, deve-se buscar superar as eventuais diferenças de idades e que precisa se estender pela formação de grupos de trabalho diversos e não só em termos etários;

  • A promoção e participação em eventos, sejam de caráter empresarial (ex: feiras de negócios), sejam de caráter social (ex: confraternização de fim de ano), devem ser boas oportunidades para integração e conhecimento mútuo;

  • Programas de gestão de talentos são uma ótima condição para premiar as características mais valiosas e aptidões úteis estrategicamente para determinadas áreas da empresa;

  • Realização periódica de pesquisas de clima organizacional, que entre outras coisas devem identificar como o fator etário influencia o clima.

Atualmente os profissionais de RH têm amplo conhecimento a respeito dessa dura realidade e por isso são capazes de conduzir uma série de ações e implementar estratégias para o combate ao etarismo e as consequências negativas que ele pode produzir para os negócios.

Conclusão

O etarismo e que se manifesta como preconceito de acordo com a idade de uma pessoa, tem sido um problema real com o qual as empresas precisam lidar.

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