O jeito certo de contratar um vendedor
Houve um tempo não muito distante, em que contratar um vendedor parecia ser tarefa das mais simples. Bastava colocar um anúncio e rapidamente se tinha uma pilha de currículos em mãos. Às vezes, nem anúncio algum era necessário. A notícia de que a empresa X estava contratando um vendedor circulava de boca em boca e de forma igualmente rápida, quem se interessava descobria que a vaga já estava ocupada.
O que mudou? Por que contratá-los não é mais tão simples? Por que o turnover é elevado? Por que é difícil formar e manter uma boa equipe de Vendas?
Compreender o contexto atual de Vendas e seus protagonistas, é essencial para encontrar as respostas para perguntas como essas acima.
Superando velhos paradigmas
O primeiro grande passo para contratar certo e assim poder formar uma equipe de campeões de Vendas, é superar paradigmas que se consolidaram ao longo de décadas e que se não são totalmente responsáveis por decisões equivocadas, influenciam negativamente a condução do processo.
Boa parte desses paradigmas estão relacionados com o perfil “ideal”, se é que ele existe. Em nosso artigo “Qual o perfil de vendedor ideal e como encontrá-lo” em vez de definir esse perfil, apontamos os critérios que devem ser usador para traçá-lo.
Mas há outros, como as atribuições do vendedor, ou talvez o papel e a responsabilidade da empresa, que são igualmente importantes, mas comumente negligenciados e logo mais veremos mais a respeito.
Por fim, mas não menos importante, superar convenções que muitas vezes estão fortemente arraigadas não só na própria empresa, mas no mercado de uma maneira geral, exige elevado grau de maturidade e humildade, afinal passa por reconhecer seus próprios erros.
6 passos para contratar um vendedor
Antes de mais nada é preciso ressaltar que não existe só um modo certo de contratar um vendedor e inclusive é possível contar com excelentes profissionais trilhando caminhos diferentes, afinal até a casualidade é um fator que pode estar presente.
Devemos ter em mente que como a maioria das coisas na vida, 100% de certeza é utopia, ainda mais por envolver o ser humano e sua natureza única.
No entanto, o trabalho reside em caminhar nessa direção, ainda que nunca cheguemos lá. Em outras palavras, com essa maneira de trabalhar, as nossas chances de sucesso aumentam significativamente e naturalmente considerando somente o que é possível controlar.
1. Definição do perfil do vendedor
Assim como propusemos anteriormente no artigo citado (perfil de vendedor ideal), não espere encontrar aqui uma lista com as características que o seu departamento de Recursos Humanos ou a agência ou a consultoria que o assessora nesse tipo de questão, deve identificar no processo seletivo.
E desconfie de quem disser algo em contrário, já que não se pode esperar que vendedores de helicópteros, vendedores de cosméticos e vendedores de sistemas de gestão comercial, tenham exatamente as mesmas características.
Tal afirmação é verdadeira e comprovável, até mesmo em uma mesma empresa.
Quão diferentes não podem ser os vendedores que só se saem bem atuando junto aos compradores profissionais das grandes redes varejistas comparativamente àqueles que só conseguem atender o pequeno mercado de bairro, cujo comprador costuma ser o próprio dono do estabelecimento?
Entretanto, há sim alguns aspectos que são desejáveis, independentemente do ramo de atuação e das suas particularidades:
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Organização – a falta de organização e método, é um dos erros mais comuns em Vendas e em vendedores, geralmente justificada com respostas como: “Meu negócio é vender. Deixa isso para o pessoal de administração”. O vendedor que não administra bem seu tempo, seja pela desorganização, seja por qualquer outra razão, perde vendas;
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Trabalho em equipe – vendedores no passado eram como lobos solitários e 99% do seu tempo era fora da empresa nas visitas aos clientes. A tecnologia trouxe a maioria deles para dentro da empresa e também exige que eles interajam muito mais com as pessoas (outros vendedores, pessoal de administração de vendas, do pós-vendas, do financeiro, etc);
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Atualizados – a mesma tecnologia anteriormente citada, obrigou o vendedor moderno a aposentar toda aquela papelada que ele tinha na sua pasta. Suas ferramentas são o CRM, o SGV (Sistema Gerencial de Vendas), o Pipeline, outros sistemas na Intranet, o WhatsApp, o cliente de e-mail e quem sabe mais meia dúzia de outros sistemas, o que significa que ele precisa estar atualizado em relação a tudo isso;
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Empatia – não confundir com simpatia e que também não significa que o profissional não deva ser simpático. Aquele que tem a capacidade de colocar-se no lugar do outro, ainda que não compartilhe da mesma opinião, geralmente tem características essenciais, como se comunicar com eficácia;
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Honestidade – é preciso que ele seja transparente, verdadeiro, que não minta e não engane seu cliente, sob pena de não conquistar a sua confiança. Afinal, não é “nós contra eles”. Hoje o vendedor deve ser um aliado do cliente, tanto que algumas empresas o chamam de consultor de vendas. É lógico que algumas o fazem pelo sentido pejorativo que o termo ganhou com o tempo, mas compreender o que isso significa, é crucial;
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Ser vendedor – ser vendedor, é diferente de estar vendedor. Foi-se o tempo em que vendedor era quem não tinha um curso de graduação qualquer, mas falava bem. O verdadeiro profissional de Vendas deve contar com um conjunto de conhecimentos que contribuem para seu desempenho e ser um especialista no assunto. Quem é vendedor, não se vê fazendo outra coisa, senão vender.
Entenda que definir de forma precisa as soft skills e encontrá-las nos candidatos, é fundamental para a continuidade do trabalho.
2. Conheça seus clientes
Sim, conhecer muito bem seus clientes é fundamental para contratar certo, já que o vendedor será um elo frequente de contato entre sua empresa e eles.
Inclusive como já mencionamos, parte importante da determinação do perfil passa por isso.
Pense nisso como sendo o conjunto de competências que o vendedor precisa reunir para cuidar dos seus clientes e atender suas necessidades, desejos e expectativas.
Para tanto, a empresa e o vendedor precisam aprender a escutar seus clientes.
3. Processo seletivo
Essa é outra etapa que muitas vezes não é conduzida apropriadamente, justamente por conta dos estereótipos e dos preconceitos que se consolidaram ao longo de décadas.
Acostumamo-nos a ideia de que vendedor tem “cara de vendedor”. Querendo ou não, essa é uma premissa equivocada e carregada de preconceito.
Que “cara” tem um “vendedor de verdade”?
Portanto, cuidado! O processo seletivo precisa ser conduzido com o mesmo profissionalismo e isenção envolvido em qualquer outro cargo da empresa, com aplicação de entrevistas, testes psicológicos para identificação das características necessárias e desejáveis, dinâmicas em grupo e tudo o mais que for possível e necessário.
E aqui há erros comuns que às vezes são cometidos justamente por essa carga de preconceitos associados, como desconsiderar um currículo pela pouca experiência e dar pontos a favor pela larga experiência.
Um candidato com pouca ou mesmo nenhuma experiência, mas com um perfil altamente positivo, pode se tornar um excelente vendedor, mas geralmente as empresas não estão dispostas a investir na sua formação.
Por outro lado, um currículo que ostenta passagens em várias empresas do setor e, portanto, experiência, também pode ser indicativo de problemas. Bons vendedores podem ficar por décadas em uma só empresa e até se aposentarem nela.
4. Venda sua empresa, sua marca, seus produtos
“Nenhum vendedor vende o que ele próprio não compraria”, é praticamente um mantra de Vendas.
Isso tem muitos possíveis significados, mas os que mais importam, são:
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Transparência – seja honesto com o candidato, tal como espera que ele seja com seus clientes e mostre a empresa como ela realmente é, com suas qualidades e virtudes, mas também com seus defeitos e desafios a serem superados;
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Interesse – investigar o interesse do candidato pela empresa, pela marca e seus produtos, é essencial. Quem compra quer saber tudo e não deve ser diferente com o vendedor. O quanto e o que ele pergunta no processo seletivo, mostra seu interesse ou seu desinteresse;
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Inversão – é frequente negligenciar um fator essencial, que é o gestor. Assim como este tem suas preferências em relação aos seus vendedores, o inverso também é verdade. Por isso, levante quais suas expectativas em relação àquele que será seu responsável imediato e com quem deve ter uma relação diária e estreita;
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Expectativas – o que o candidato espera de uma empresa para que sua relação seja harmônica e duradoura? E sobre o clima e as condições do ambiente de trabalho? E da equipe da qual ele fará parte? Esse tipo de investigação visa verificar as chances de sucesso na sua integração.
Logo, é preciso abandonar a condição autoritária na qual somente a empresa dá seu veredito, se contrata ou não. Alguns aceitam apenas por uma remuneração que é atrativa, mas quando essa é a razão, facilmente serão seduzidos por quem estiver disposto a pagar mais ou oferecer condições mais simpáticas aos seus desejos.
5. Remuneração
Embora não caiba mudar no transcurso do processo, remuneração do departamento comercial é algo geralmente envolto em premissas erradas, como a de que “vendedor de verdade, não depende de salário fixo” ou que “vendedor de verdade, faz seu salário só com as comissões”.
Esse é outro ponto em que não há um padrão único e aplicável a todas as realidades. Nem tampouco, o que todo mundo pratica em um segmento, necessariamente deve ser a regra na sua empresa.
O modelo de remuneração deve ser sim pensado em estimular e, sobretudo, premiar o desempenho positivo e o atingimento de metas de vendas, as quais costumam ser estabelecidas apenas considerando o que a empresa quer e/ou precisa, mas sendo totalmente alheias a fatores outros.
Há até as que excluem os vendedores de outros programas, como das políticas de Marketing de Incentivo, justificando que eles já ganham comissões e prêmios que exprimem seu bom desempenho.
Já passou da hora das empresas compreenderem que esses mesmos “vendedores de verdade” podem ser seu principal meio de enfrentamento aos concorrentes e que um “tapinha nas costas” e os parabéns, não bastam.
6. Acompanhamento
Alguns dirão que ao chegar nesse ponto, o vendedor já está contratado e, portanto, já não é parte do processo de contratação.
Todavia, é aqui que muitos vão embora e voltamos à estaca zero.
Essa fase na verdade compreende outras etapas:
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Integração – por justificativas esdrúxulas e sem cabimento, que nem merecem ser mencionadas aqui, muitas empresas não fazem a integração do novo colaborador (onboarding) quando ele é vendedor, o que só o afasta dos demais e contribui para sua lista de possíveis insatisfações e sua integração;
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Acompanhamento – o acompanhamento propriamente dito e que é responsabilidade do seu gestor imediato (gerente / supervisor), normalmente é muito curto e não leva em consideração que a fase de adaptação à nova realidade, é igual para qualquer cargo. Abrevia-se sua duração na proporção inversa da sua experiência;
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Prazo de experiência – o prazo de experiência de vendedores costuma levar em consideração apenas seus números de vendas, o que além de pressão inadequada, também não deve ser critério único de avaliação do seu desempenho;
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Treinamentos – indevidamente chamados de treinamentos, porque na maioria das vezes consistem apenas de uma apresentação rápida da empresa e dos seus produtos / serviços. Se bem conduzida, coincide com o acompanhamento do gestor e de outros vendedores mais experientes.
Conclusão
A contratação de vendedores ainda envolve premissas e paradigmas ultrapassados e que acaba favorecendo o elevado turnover e equipes inconsistentes.