O mundo pós pandemia do coronavírus

Não é preciso ser futurólogo e tampouco especialista em algo para enxergar que muita coisa mudou. É claro que muitas das situações que vivemos hoje, são momentâneas e em poucos meses, “tudo vai voltar ao normal”!

Vai mesmo? O que é normal? O mundo pós pandemia será o mesmo de antes? De sociólogos a filósofos, economistas a cientistas, passando por especialistas em alguma área do saber até o mais reles trabalhador de uma grande cidade ou de um rincão escondido do mundo, pergunta: “Como será o mundo pós pandemia do coronavírus?”.

Por que mudar?

Que haverá mudanças, é consenso. O que ainda não se sabe, é o que e o quanto mudará.

Mudanças acontecerão e novos paradigmas devem surgir, porque a pandemia revelou o que muitos já sabiam, mas em alguma medida, não nos atingia diretamente, não nos afetava.

O coronavírus nos fez ver de modo mais explícito que em determinadas situações, a distinção de classes pouco importa. E ao mesmo tempo – por paradoxal que pareça – faz toda a diferença. O vírus não conhece classe social, mas a letalidade e os impactos da pandemia, variam de acordo com vários aspectos, como a proteção social que o Estado destina ou não à população, bem como se ele consegue ser presente na vida dos menos amparados.

São aspectos como esse, que evidenciam porque é preciso mudar. Os modelos econômicos, sociais, culturais, entre outros, mostraram-se frágeis diante de situações extremas ou do imponderável. Não há planos de contingências.

Foi assim com a Peste Negra, com a Gripe Espanhola, ou com a Primeira e Segunda Guerras Mundiais, que trouxeram algumas mudanças perenes e outras passageiras, tal qual a fatalidade de Mariana, não trouxe aprendizado e não bastou para impedir que acontecesse em Brumadinho.

Os marcos históricos são muitos e esse certamente constará dos livros de História. Mas a pergunta que fica, é o que não será mais como era antes e o que voltará a sê-lo.

Ficou claro também, que o social não pode ser desvinculado do todo. Não existe economia sem social. Não existe cultura sem social. Sem preocupações de cunho social, várias outras tornam-se sem sentido. O ser humano e seu papel na formação da sociedade, é tudo.

O lucro acima de tudo, passando por cima das pessoas, a qualquer custo e qualquer preço – e que sempre foi um mantra questionável – com a pandemia perde lugar para a mera sobrevivência de muitos negócios. Quantos deixarão de existir ao fim de tudo?

Hoje as organizações são obrigadas a pensar no consumidor – que é ser humano – como sua razão de ser, muito além do simples discurso, ou como parte da sua missão no site institucional das empresas. Sem o trabalhador, não há renda, não há consumo, não há lucro. Nesse cenário, o capital não existe e não produz nada.

Esse mesmo trabalhador, é hoje lembrado sob o uniforme de um auxiliar de limpeza, atrás do avental de um médico, do outro lado da catraca de um ônibus, correndo com sacos repletos do que ninguém mais quer para manter nossas ruas limpas, na outra ponta do cabo de enxada para alimentar uma nação. Tínhamos que chegar a esse ponto para lembrar e aplaudir esses e tantos outros anônimos e sempre esquecidos?!

O que vai mudar após a pandemia?

Algumas coisas são certas. Outras esperadas. Algumas transformações já vinham em curso ou vislumbradas no horizonte e o que a crise fez, foi apenas acelerá-las ou intensificá-las.

Poucas mudanças virão para ficar. Outras o tempo e a memória farão esvanecer. Vai antecipar outras mudanças e tendências. A tecnologia deve produzir muitas respostas e alternativas para momentos extremos. A Economia tem que ser repensada, visto que a intervalos cada vez menores, tem sofrido solavancos.

Vários daqueles que nunca precisaram do apoio do Estado e das políticas assistenciais, agora podem ver e sentir como é quando fatores alheios a sua vontade e controle, limitam ou mesmo privam seus proventos e se faz necessário a sua intervenção.

A Internet, tal qual a conhecemos, não é nova. Já são mais de duas décadas e pode-se dizer que ela é resultante de novas necessidades, bem como despertou ou favoreceu o surgimento de um universo de outras tantas. Mas é indubitável que a Internet por meio dos seus serviços e de tudo que ela proporciona, foi posta a prova como nunca antes.

Precisamos de uma Internet ainda mais forte, mais rápida, mais estável. Descobrindo gargalos, criando e ampliando serviços.

Se boa parte do mundo não parou, foi graças a Internet. Empresas aumentaram sua presença digital e usaram de todas as ferramentas ao seu alcance, para continuar fazendo negócios. As que ainda não tinham nem um pé no mundo virtual, correm em busca de algum espaço nesse momento, pelo menos na tentativa de manterem-se vivas.

Pessoas tem conseguido superar o distanciamento social, usando as redes sociais, que antes eram uma opção cômoda de contato, mas que hoje são a única maneira possível. Ironicamente, hoje que não podem, sentem falta do fator presencial.

Deverá ser emocionante ver os primeiros encontros sociais, quando tudo isso passar e o celular não for mais o protagonista, perdendo espaço para o abraço, o aperto de mão e o bom e velho papo frente a frente.

Os sites em suas diferentes manifestações (o blog, a rede social, a loja virtual, …) tem sido o lazer, a comunicação, a informação e a desinformação, o jeito de vender e de pedir comida, a reunião em torno do trabalho, para educação e conhecimento, para adquirir formação diante de uma nova realidade econômica, o modo de suportar viver dia após dia, entre quatro paredes.

Eles já existiam antes, mas agora mostram-se essenciais mais do que nunca!

O coronavírus apressou projetos ou apenas elucubrações que agora tornam-se imperativos e urgentes. Mas como correr em meio um mundo que está quase parado e isolado? A verdade é que muitos daqueles que ainda não estavam digitalmente presentes, vão se lamentar se não tiverem tempo e fôlego para esperar a pandemia passar.

O teletrabalho, o home office, o ensino a distância, o freelancer, o nômade digital e tudo que tem relação, ganhou ainda mais destaque. Se antes eram tendências e em alguns poucos casos realidades, agora tendem a ser ainda mais considerados como alternativas viáveis, com evidentes ganhos, especialmente nos grandes centros.

Se por um lado há prejuízos de diversas ordens, há gratas surpresas. Adversários, concorrentes, pessoas e organizações com ideários e objetivos diversos, unindo-se solidariamente em prol de um bem comum.

Embora não seja crível que isso permaneça quando a tempestade passar, é um alento de esperança que nem tudo esteja perdido e que a unidade em torno de um propósito, não é utopia.

Há ainda o campo dos valores, intangíveis e individuais, mas que reúnem a solidariedade, a empatia, o respeito ao próximo, o reconhecimento, a dignidade, entre um amplo conjunto que vinha tão relegado a segundo plano e que afloraram nestes últimos poucos meses. É esperar e desejar que o tempo não nos deixe esquecer porque eles são tão importantes para o futuro da espécie humana.

O que não mudará com a pandemia?

O catador de latinhas e papelão, esse ser que já vagava por aí em busca de sobreviver um dia após o outro, invisível aos olhos da maioria, que em tempos de coronavírus, é exposto tanto quanto os valorosos médicos, mas que ao contrário destes, não é aplaudido e muito menos, lembrado.

É verdade que o mundo foi obrigado a enxergar a sujeira que por tanto tempo foi posta debaixo do tapete. É verdade também que o homem tem se lembrado do significado da palavra humanidade. Mas o que precisa ficar claro, quando tudo isso passar, que assim como o catador de latinhas, há um contingente imenso de seres humanos que vivem a margem de tudo.

Terá valido a pena em parte, por tudo que conseguimos que perdure, mas ainda não terá sido o suficiente se não conseguirmos fazer com que nações e seus povos enxerguem que há muito mais a ser feito e que a capacidade de mobilização que foi colocada a prova nesse momento tão crucial, tem que servir para iniciar transformações tão importantes quanto as que estão em curso hoje.

Quantas Itálias ou Espanhas existem na África, bem antes da COVID-19? Quantas Rocinhas e Paraisópolis passam por necessidades as mais básicas, de ordem sanitária, social, econômica, bem antes da COVID-19?

Grandes perdas, produzem grandes reflexões e reavaliações. Valorizar o que estava esquecido ou em segundo, terceiro, ou mesmo quarto planos, é fundamental para que esse marco histórico de fato produza não apenas mudanças por obrigação, mas por conscientização plena e permanente.

Que o ar mais puro e livre da poluição dos automóveis nas grandes metrópoles, que o consumismo desenfreado agora limitado ao essencial, que a dedicação exaustiva em busca da manutenção da vida e da garantia de elementos de subsistência a uma grande parcela das pessoas e que tudo que sempre foi certo, mas que hoje é posto sob ameaça, sirva para produzir as mudanças que o mundo precisa.

Conclusão

O coronavírus assim como ocorreu em outros momentos da história, deve representar um marco, após o qual muitas coisas devem mudar. Algumas terão um caráter mais permanente e outras serão passageiras. As lições que a COVID-19 e seus impactos na humanidade, devem servir para vislumbrarmos que mudanças o mundo precisa promover.

Comentários ({{totalComentarios}})