Quem é o workaholic, quais os sinais e seus riscos?

Já foi – e ainda é, para muita gente – motivo de orgulho fazer constar nos seus perfis nas redes sociais, ou quando instado a se definir em uma entrevista de emprego, classificar-se como workaholic.

No entanto, já há alguns anos essa condição tem sido visto com outros olhos e o que era considerada uma característica de perfil profissional positiva, desejável e até revestida de glamour, tem gerado preocupação.

Compreender quem é o workaholic, as origens dessa circunstância, suas consequências e como tratar a questão, é o nosso propósito hoje.

O que é uma pessoa workaholic?

A publicação de “Confessions of a Workaholic” no ano de 1971, de autoria de Wayne Edward Oates, um psicólogo e educador religioso americano, que entre outros conceitos, definiu o workaholic como alguém com uma incontrolável necessidade de trabalhar incessantemente, foi importante para popularização do termo.

Sim, você não leu errado. Na década de 70 o termo já existia e eventuais usos são anteriores à publicação de Oates.

O workaholic costuma ser assim classificado, por sua aparente incapacidade de limitar a quantidade de tempo que gasta no trabalho, apesar das eventuais consequências, de forma semelhante ao que ocorre com a compulsão pelo consumo de bebidas alcoólicas.

Inclusive, é dessa comparação que se origina a palavra: work (trabalho) + alcoholic (alcoólatra). Também por semelhança, que se convencionou chamar de workaholism a condição da pessoa, apenas que diferentemente do alcoolismo, tem o trabalho como objeto da dependência ou vício.

Quais as consequências (negativas) e os riscos de ser um workaholic?

Se já houve o tempo em que ser workaholic era visto como uma qualidade profissional desejável, estudos, estatísticas e a prática tem demonstrado que há consequências negativas e riscos, tanto para a pessoa, como para a empresa.

Devemos ressaltar que não necessariamente todos os desdobramentos estarão presentes, porém certamente e em alguma medida, podem ocorrer algumas das situações abaixo:

  • Frustração – quando a realidade não corresponde às expectativas, as quais por sua vez frequentemente são acima da média e/ou da realidade, do possível, do exequível, a pessoa se frustra;

  • Motivação – complementarmente à consequência anterior, os mecanismos de motivação e as políticas de incentivo não surtem os mesmos efeitos que para os demais colaboradores;

  • Prazos – pelo fato de assumir para si muitas tarefas, geralmente ele não consegue dar conta de cumprir prazos. Isso pode ser prejudicial quando o trabalho em questão está ligado a ações do planejamento da empresa;

  • Capacidade de liderança – na condição de gestor, sua relação com seus colaboradores não costuma ser boa, especialmente porque ele espera que eles sejam tal como ele é. Não enxerga outro modo de se relacionar com o trabalho e é demasiadamente exigente com funcionários. Isso pode afetar sua capacidade de liderança e consequentemente, os resultados da sua equipe;

  • Relacionamento profissional – de modo semelhante ao trato com seus colaboradores, seu relacionamento com seus pares e até algumas vezes com seus gestores, também não é positivo, pois espera postura igual deles;

  • Instável emocionalmente – tende a ser bastante dependente do reconhecimento dos outros, fato que tende a prejudicar sua autoestima quando ele não acontece, o que produz uma carga emocional que afeta suas relações com os outros, podendo até mesmo interferir no clima organizacional;

  • Burnout – se for uma pessoa que “vive na empresa e para a empresa”, visando agradar seus superiores, a tendência é que em algum momento ela sofra da síndrome de burnout, que está associada a um cérebro praticamente sem energia, em esgotamento físico e mental;

  • Produtividade – a queda na produtividade é outro fator normalmente associado e que vem como resultado da sobrecarga, do burnout, dos relacionamentos profissionais não harmônicos e até da sua liderança, se for o caso;

  • Aversão ao trabalho – por paradoxal que possa parecer, alguns se tornam aversos ao trabalho, por conta do conjunto de consequências acima. No entanto, é fato que o workaholic se sente obrigado a trabalhar, ainda que ele não queira. É uma obrigação acima de qualquer outra/

  • Problemas de saúde – além do estresse resultante desse comportamento, podem ocorrer diversos problemas de saúde, como: distúrbios do sono, depressão, consumo excessivo de álcool, diabetes, problemas de memória e doença cardíaca.

O que leva alguém ser workaholic?

Não é de hoje que especialistas em várias áreas relacionadas, vêm conduzindo muitos estudos e pesquisas a respeito.

Há conclusões únicas, mas há muitas comuns a respeito dos motivos que levam alguém a ter um comportamento profissional classificável como workaholic.

É importante ter ciência de que o conjunto de razões pode ser amplo, algumas têm origem histórica e variam até de acordo com o contexto das pessoas e dos ambientes das empresas. Ou seja, não há uma só explicação.

1. Empreendedorismo

Empreender frequentemente está associado a grandes doses de dedicação ao trabalho. Aquele que inicia um novo negócio, especialmente quando não tem condições financeiras para contratar pessoas para todas as atividades, tem que se desdobrar e trabalhar muitas horas até se consolidar ou ao menos começar a colher os primeiros frutos.

É natural e compreensível que seja assim, no entanto, passa a exigir cautela quando mesmo após a fase inicial, a dedicação além do normal e do razoável, perdura.

Há até a crença estabelecida e difundida entre muitos, de que na condição de dono, seu empenho precisa ser o máximo possível, até como exemplo, ou como algo que se espera dele por parte dos seus funcionários.

2. História

Tivemos vários momentos históricos nos quais o trabalho árduo foi visto como necessário e até condição indispensável.

Como por ocasião da Revolução Industrial, que em meio a tantas coisas, tornou essenciais conceitos como máxima eficiência e elevada produtividade, ou aspectos indiretos, como a maximização dos lucros e que para tanto, por exemplo, pressupunha diminuir a quantidade de mão de obra, sem a diminuição da produtividade.

O Japão do pós II Guerra Mundial, também viveu movimento semelhante, embora por razões diferentes, já que os trabalhadores do país precisavam se empenhar na sua reconstrução.

Bem mais recentemente, o avanço comercial da Internet, revelou ao mundo a geração de jovens empreendedores digitais, que passavam noites em claro na frente dos seus computadores, criando as bases das empresas “ponto com” e de onde surgiram muitas das atuais Big Techs.

Há muitos outros capítulos diferentes no enredo, mas que têm em comum o fato de que seus atores sempre foram “premiados” pelo extremo empenho no trabalho e que invariavelmente está muito acima da média das outras pessoas.

Desse grupo, o controvertido Elon Musk teria escrito sobre trabalhar em alguma de suas empresas, no Twitter – agora X – em 2018, que: “Há lugares muito mais fáceis de trabalhar, mas ninguém nunca mudou o mundo com 40 horas por semana”.

Posturas como a de Musk, além de ajudar a consolidar o ideário do que deve ser o trabalho, são também o pano de fundo da próxima razão.

3. Exemplos

Biografias de pessoas bem-sucedidas, são um tipo de livro que tem sempre um público consumidor garantido, muito por conta da curiosidade sobre as “fórmulas de sucesso” que cada um utilizou e o que se pode aprender com elas.

E se há elementos comuns nas declarações de quase todos, que podem ser diferentes nas palavras e exemplos usados, mas são iguais em teor, é a dedicação 100% e que pressupõe abrir mão de tudo em detrimento do trabalho. Tudo mesmo, em muitos dos casos!

Os filmes de Hollywood reforçam o estereótipo, retratando os executivos das empresas, os homens de Wall Street ou outros tipos de magnatas, cujo envolvimento no trabalho é integral. Seja nas festas, seja nos momentos com a família, ou quem sabe nas férias no local paradisíaco, sempre há um telefonema de negócios ou pessoa de confiança colocando-o a par de tudo o que está acontecendo nas suas empresas.

Todo momento, é momento de trabalhar.

4. Cultura corporativa

Na convenção anual de Vendas da empresa, o diretor comercial anuncia com pompa e circunstância, o campeão de Vendas da empresa no ano e entre muitas coisas, diz algo como: “Sabe por que Fulano chegou aqui? Porque ele era o primeiro a chegar na empresa, o último a sair e todos os clientes tinham o seu número de celular. Ele dorme com o celular, sai de férias, mas leva o notebook e o celular. Para ele, o sábado e o domingo, são até melhores para vender, do que os outros dias da semana, porque seus clientes têm tempo para ouvi-lo!”.

Na vida real, não é difícil encontrar situações muito parecidas, como nos inúmeros vídeos de empresas cujo modelo de negócio é apoiado no Marketing Multinível. Em um deles no YouTube, a orgulhosa líder diz que “enquanto todo mundo dormia, eu estava trabalhando para aumentar a minha rede”.

A verdade é que não são raras as empresas que ou estimulam abertamente esse comportamento, ou mais sutilmente, apenas “sugerem” como caminho para o sucesso.

5. A trajetória

A própria trajetória de muitos workaholics reforça seu comportamento. Isso porque é natural que dedicação acima da média, em algum momento ou até em muitos, premiará esse esforço.

Sendo assim, uma parcela que experimentou o sucesso em determinados momentos da sua trajetória profissional, acaba acreditando que não há outro caminho, senão o trabalho incessante.

Por outro lado, quando o desempenho ou a recompensa não vem, ele tende a acreditar que é porque não fez o suficiente no trabalho e se convence que precisa ir além. Ele tem dificuldade em ver o que está errado.

Há também os jovens que estão ingressando no mercado de trabalho, sem seu próprio núcleo familiar constituído e com poucas responsabilidades na vida privada e que por esse cenário, escolhem dedicar muitas horas aprendendo uma nova profissão e consolidando sua carreira.

Alguns enxergam quando é o momento de mudar a velocidade ou a direção. Outros não e tornam-se trabalhadores compulsivos.

6. Fator pessoal

Existem também as motivações pessoais para alguém ser workaholic. No caso, podem ser diferentes fatores, variando os mais influentes em cada indivíduo e com também diferentes pesos.

  • Reconhecimento – a pessoa acredita que precisa trabalhar sempre mais para receber a admiração e reconhecimento dos outros e especialmente do seu gestor imediato;

  • Ego – há aqueles que se autodenominam workaholics para se vangloriar do quão dedicados são ao trabalho, no sentido de que são incansáveis, que não desistem nunca e estão sempre dispostos a ir bem além. Veem como qualidade e a ostentam com satisfação;

  • Insegurança – é comum entre os viciados em trabalho, revelarem medos e inseguranças quanto ao seu futuro, sua estabilidade profissional e sua capacidade de se manter. Como resposta e reação, investem todas as suas forças no trabalho para diminuir as chances dos seus receios se confirmarem;

  • Válvula de escape – existem também os que usam o trabalho como válvula de escape para questões de ordem pessoal com as quais não sabem bem como lidar ou resolver;

  • Metas – quando não se sabe diferenciar, dimensionar e enxergar a relação entre metas pessoais e profissionais. Algumas vezes também quando a diferença entre o desejado e o realizável, é muito grande.

7. Razões econômicas

Razões econômicas e conjunturais também favorecem a compulsão obsessiva pelo trabalho.

Assim, elevados níveis de desemprego, mercado desaquecido ou em recessão, segmentos altamente competitivos, podem constituir algumas das razões que fazem com que as pessoas fiquem mais preocupadas do que normalmente em relação aos seus empregos e como resposta, empenhem-se mais do que o normal.

O que alguns que adotam essa postura não enxergam, é que o workaholic não é necessariamente o mais eficiente, o melhor, o mais produtivo e que são os fatores determinantes em casos assim.

O sucesso de um profissional e da empresa na qual ele trabalha, não são diretamente proporcionais ao número de horas trabalhadas. Casos e estudos não faltam para comprovar tal afirmação.

Como identificar um workaholic?

Essa é uma pergunta comum, mas cuja resposta precisa, requer cuidados em sua interpretação e entendimento.

Não se pode acreditar ser possível um “diagnóstico” a respeito, apenas com base em um conjunto de situações e características comuns a alguns workaholics.

Há o risco de, por exemplo, confundir um colaborador bastante ciente e cumpridor das suas responsabilidades, bem como comprometido com os resultados da empresa, de alguém para quem o trabalho é um vício.

A determinação do workaholism, deve ocorrer por meio de profissional devidamente capacitado, geralmente um psicólogo do departamento de Recursos Humanos.

Com isso em mente, os indícios da compulsão exagerada pelo trabalho, são:

  • Dedica sempre um número de horas acima da média dos demais, mesmo nas situações que não são urgentes ou importantes, como responder aquele e-mail em que o cliente só agradece pelo atendimento, em plena sexta-feira, às 21:00h;

  • Um típico workaholic procura realizar o máximo de tarefas que puder ao mesmo tempo. Está sempre ocupado e geralmente tem os prazos próximos do seu encerramento;

  • Consegue até dar conta de muitas tarefas, mas os resultados não costumam ser correspondentes à dedicação dispensada;

  • Quando ele faz todo o trabalho que tem que fazer em menos tempo do que o previsto, em vez de relaxar e se satisfazer, ele simplesmente busca outra coisa para preencher o tempo livre. Se não for assim, parecerá para ele desperdício de tempo ou algum tipo de erro de conduta;

  • Os principais temas das conversas mesmo fora do ambiente profissional, seja com amigos, seja com parentes, seja com quaisquer outras pessoas, costumam ser relacionados ao trabalho;

  • Não tem horários para entrar, sair, para pausas para um cafezinho e nem para o próprio almoço. Frequentemente nem almoça ou toma só um lanchinho, porque é mais rápido e não “atrapalha o serviço”;

  • Leva trabalho para casa, dispõe-se a trabalhar nos feriados, nos finais de semana e até vende suas férias, porque a empresa não pode ficar sem ele;

  • Não hesita em desmarcar compromissos pessoais, privar-se de momentos com a família, com os amigos ou abdicar do lazer, em função das questões profissionais;

  • Dormir menos ou até dormir no trabalho, para ter mais horas disponíveis para suas atividades profissionais;

  • Mesmo quando consegue dedicar algumas poucas horas para atividades da vida pessoal, está sempre checando os e-mails, as possíveis mensagens dos contatos profissionais, realizando telefonemas, fazendo anotações ou quem sabe até usando esse raro tempo livre, para fazer um curso com foco no seu trabalho;

  • Sente-se “culpado” quando está fazendo qualquer coisa que não esteja relacionado ao trabalho.

Conclusão

A compulsão permanente pelo trabalho, não deve ser vists como qualidade, pois pode produzir consequências e riscos graves ao profissional e à empresa.

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