O que é empresa familiar, tipos, vantagens e desafios?
Segundo pesquisa do Sebrae e IBGE, elas representam 80% das empresas no mundo e 90% no Brasil, números que apontam sua relevância e a atenção necessária para esse enorme e representativo grupo – as empresas familiares.
Da mesma forma que as empresas “não familiares”, elas têm suas próprias características que influenciam positivamente ou negativamente sua atuação, seus resultados e até mesmo seu futuro.
É disso que trataremos hoje, bem como compreender suas diferenças, as vantagens desse modelo de negócio e que desafios elas precisam superar.
O que é uma empresa familiar?
De modo geral, costuma-se definir uma empresa como sendo familiar, aquela que tem duas ou mais pessoas da mesma família trabalhando no negócio, sendo que pelo menos uma delas exerça algum papel de controle, podendo ser um sócio que detenha a maior percentagem de participação no capital da empresa, ou talvez um administrador de elevado nível hierárquico e com grande poder de decisão.
Mas apesar de ser bastante intuitivo, a conceituação de empresa familiar pode ser bem mais ampla e envolver várias outras situações.
Basta olharmos muitos dos maiores exemplos de empresas classificáveis como familiares, como o Walmart, a Volkswagen, a Oracle, a Nike ou a Roche, em termos globais, ou as brasileiras Magalu, a JBS, a Gerdau ou a Weg.
Cada qual tem diferentes quantidades de familiares, com diferentes níveis de participação e papéis nos negócios. Cada uma viu seus membros atuando de diferentes formas e com diferentes graus de responsabilidade no seu desenvolvimento.
Há aqueles que controlam grande volume de ações, mas se mantém distantes da administração do negócio e da tomada de decisões, mesmo as estratégicas, conferindo essa tarefa a terceiros. Como há também os que se mantém ativos no dia a dia e ainda cumprem a função e o cargo de direção geral.
Existem aquelas cujo comando já está na segunda ou terceira geração, com décadas ou até séculos de atuação e que hoje são comandadas pelos filhos, netos ou bisnetos dos seus fundadores.
E quando olhamos para as microempresas, a variedade cresce, como nos exemplos das que não têm nenhum colaborador contratado de fora de núcleo familiar, mas só pessoas de uma mesma família, nos quais é possível encontrar casais e seus filhos, irmãos, sobrinhos e outros níveis de parentesco.
Quais os principais tipos de empresa familiar?
Como mencionamos, as empresas familiares podem ser classificadas em tipos diferentes, de acordo com sua constituição estrutural e administrativa.
Empresa familiar tradicional
Tipo mais comum de empresa familiar, engloba aquelas nas quais o controle e operação é feito pelos membros da família. Têm capital fechado, sendo a situação da grande maioria das empresas brasileiras, que são micro, pequenas ou médias.
Nesse grupo, os cargos de gestão, especialmente os principais, como financeiro e administrativo, costumam estar a cargo dos membros da família e definidos prioritariamente por confiança e pelos que têm mais “jeito” e afinidade com o assunto.
Predomina a pouca transparência financeira e administrativa, bem como pouca ou nenhuma formação técnica. Muitas vezes o conhecimento é adquirido empiricamente e no dia a dia.
Empresa com administração familiar
Em linhas gerais é muito semelhante ao tipo anterior, mas o estabelecimento dos papéis desempenhados, ocorre de modo mais profissional.
Ou seja, quem assume cada cargo e suas respectivas responsabilidades, não é quem prefere aquela área, ou foi designado pelo principal gestor, mas quem reúne mais conhecimento e experiência. Não raramente, a pessoa que assume um cargo, continua seu desenvolvimento profissional, com cursos diversos, formação em nível superior e outras ações de aprimoramento.
Empresa familiar híbrida
Nesse tipo, as empresas têm uma gestão profissionalizada, em que vários dos cargos mais importantes e estratégicos, são ocupados por gestores profissionais, ou seja, a atribuição decorre da capacidade acima de tudo.
Apresenta mais abertura em relação aos tipos de empresas familiares anteriores.
Essa é uma condição que favorece que o capital seja aberto, ainda que o controle seja exercido pela família, quando detém controle acionário.
Tais características, conferem mais transparência e profissionalismo.
Empresa de controle ou de investimento familiar
Também têm capital aberto, mas a família não busca mais o controle administrativo do negócio, apenas a influência e o investimento para que ele continue crescendo. Com isso, os cargos de gestão, independente da relevância estratégica, são ocupados estritamente pelos profissionais de mercado mais capacitados.
Mesmo assim, ainda é considerada uma empresa familiar, pois ela possui uma parcela significativa das ações, patrimônio ou ativos do negócio, a ponto de ter forte influência – mesmo que indireta – na administração.
Modelo de gestão das empresas familiares
Um aspecto característico e comum na maioria das empresas familiares, é seu modelo de gestão e que está diretamente ligado a ocupação dos cargos pelos diferentes membros.
É importante entender que do modelo de gestão existente, vem a cultura da empresa e que fica claro conforme vemos o que caracteriza cada um.
Gestão paternalista
É um modelo bastante comum no qual o principal gestor, normalmente aquele que iniciou o negócio ou que é o sócio majoritário, centraliza todas as decisões, ou as mais importantes e ouve pouco os demais sócios e os gestores a ele subordinados.
Há relações de hierarquia claramente definidas e bem rígidas. Ou seja, a tomada de decisão é com base em poder e não em qualificação profissional.
A gestão paternalista até pode funcionar nas situações em que há competência técnica e experiência por parte do decisor, mas dificulta muito o crescimento de uma empresa, porque nem sempre é o cenário observado.
Quando o gestor não tem a bagagem profissional necessária para o conjunto de decisões a ele submetidas, ele passa comprometer os respectivos resultados.
Gestão participativa
O modelo de gestão participativa apoia-se em dois pontos essencialmente distintos do anterior. O primeiro é que as decisões não são centralizadas e o segundo, que a gestão é algumas vezes compartilhada com profissionais da área e que não obrigatoriamente pertençam ao núcleo familiar.
Embora em alguns casos a palavra final ainda possa ser do fundador ou de alguém com mais poder na família, especialmente nos casos de impasses ou questões controversas, membros de dentro e de fora da família têm voz e participação nas decisões.
Os interesses do grupo geralmente se sobrepõe ao individual.
Gestão Laissez-faire
Em tradução literal, a expressão laissez-faire significa “deixe fazer”, dos verbos em francês laisser (deixar) e faire (fazer).
Resumidamente, significa a liberdade para funcionar sem interferências externas.
Nesse modelo, mantém-se a relação de hierarquia e o poder dos familiares para as decisões estratégicas, no entanto, os gestores que não pertencem ao núcleo familiar e os colaboradores, são considerados de confiança e têm algum nível de autonomia para decidir sobre os meios para alcançar os objetivos da empresa.
Gestão profissional
Independente de preferências pessoais, poder ou mesmo grau de influência, a gestão é entregue aos profissionais de mercado que demonstram mais experiência e qualificação.
É a situação quando os membros da família reconhecem a necessidade de eficácia, objetividade e inteligência na tomada das decisões e buscam perfis de profissionais que sejam hábeis e competentes na análise da situação, bem como dos riscos e das oportunidades.
Vantagens das empresas familiares
No Brasil e no mundo proliferam empresas familiares, ainda que ao longo do seu desenvolvimento elas tenham mudado e se moldado às mudanças e às exigências de mercados bastante dinâmicos e voláteis. Algumas delas inclusive foram as responsáveis por muitas dessas mudanças.
Logo é de se supor que algumas das características desses modelos de negócios, contém como vantagens.
Não é a toa que algumas das empresas mais antigas do mundo são empresas que surgiram no seio de uma família, havendo algumas que sobreviveram e prosperam ao longo de séculos.
1. Agilidade
Se por um lado a concentração de poder pode ter consequências não muito positivas, ela favorece quando o assunto é velocidade nas decisões.
Modelos mais horizontalizados de gestão, podem ser mais democráticos, mais ricos em ideias e propostas e até produzir resultados melhores, por maior interação de pessoas, mas são também mais burocráticos e demorados para produzir desfechos.
2. Envolvimento / compromisso
Gestores profissionais devem ter compromisso e envolvimento com os resultados. Mas por mais que essa faceta profissional esteja presente, é inegável que o nível será maior por parte de um gestor que também é em parte dono do negócio.
O envolvimento emocional e por consequência a dedicação, o comprometimento, algumas vezes beirando o sacrifício, costuma ser maior por parte de um membro da família.
3. Flexibilidade
Em parte decorrente da vantagem anterior, os gestores familiares costumam mostrar maior flexibilidade e disponibilidade para todas as questões que envolvem compromissos da empresa.
Também têm maior liberdade e acessibilidade nas situações que envolvem interações com gestores de outras áreas e que também são ocupadas por parentes.
4. Comunicação
Observa-se que a comunicação é mais fluída, menos formal e menos burocratizada, tornando-a mais eficaz e ágil.
Fundadores e sucessores, geralmente têm maior abertura com os funcionários e a comunicação costuma ser muito mais simples, direta e clara do que normalmente em outras empresas, nas quais raramente você verá um presidente dirigindo-se diretamente a um operário.
Em casos assim, além de verticalizada, ela passa por tantos etapas quanto há de níveis hierárquicos separando um em outro, tornando-a demorada e por vezes, perdendo-se informações importantes nesse processo.
5. Confiança
Especialmente quando se consegue ocupar as posições estrategicamente mais importantes com membros da família, a confiança mútua costuma ser maior.
Sabe-se que ainda que talvez não exista a bagagem profissional, haverá o empenho, a busca pelos interesses comuns, os mesmos valores e uma só cultura organizacional.
6. Valores
A manutenção dos valores, da missão e da visão, costuma ser mais presente e defendida de modo mais intenso.
Se por exemplo, a personalização e a qualidade no atendimento a clientes, é um valor de fato essencial para o negócio, será muito mais fácil vê-lo sendo praticado em uma empresa familiar.
Quais os principais desafios das empresas familiares?
Se por um lado há vantagens apreciáveis nas empresas familiares, há também alguns desafios que todas elas têm que superar em algum momento de suas trajetórias.
É importante salientar, que os desafios a seguir não estão necessariamente todos presentes em toda e qualquer empresa familiar. Todavia, é mais comum encontrá-los nessa classe de empresas, por conta de alguns aspectos comuns a elas.
1. Liderança
Não é segredo que a liderança é essencial para os resultados. Uma mesma equipe pode produzir resultados substancialmente diferentes, mudando-se apenas o gestor e por consequência, o estilo de liderança, afinal autoridade do cargo, não é o mesmo que autoridade conquistada pelo conhecimento, pela experiência e pela competência.
Ao entregar um cargo a alguém simplesmente porque ele carrega o mesmo sobrenome, corre-se o risco de fazê-lo com alguém que não tem o preparo e/ou nem perfil para desenvolver liderança eficaz sobre a equipe.
2. Políticas
A informalidade é um traço comum em empresas familiares, especialmente as micro e pequenas. Nas que têm um modelo de gestão paternalista, é o patriarca – matriarca quando mulher – que determina o que fazer quando cada situação se apresenta.
A inexistência de políticas, regras e normas, claras e previamente definidas e de conhecimento de todos, estabelece o que fazer e como os colaboradores devam se portar diante das diferente situações quotidiana.
3. Planejamento
Ter e seguir um planejamento estratégico, não constitui apenas de um desafio das empresas familiares, mas geralmente de todas as pequenas e microempresas.
Muitas delas, não têm planejamento algum. Simplesmente “vivem” um dia de cada vez, mas nas empresas cujo modelo de gestão é paternalista, é um aspecto mais comumente presente.
Eventualmente há algumas pequenas missões ou responsabilidades que são delegadas pelo gestor paternalista a um seu parente, do tipo: “deixo sob sua responsabilidade cuidar do lançamento do produto X”.
4. Pessoal vs Profissional
Um problema comum em empresas familiares, decorre do vínculo pessoal dos envolvidos – sócios e gestores e seus respectivos colaboradores. É frequente que as eventuais diferenças de cunho pessoal, interfiram nas relações que deveriam ser estritamente profissionais.
Esse tipo de relação vai na contramão do que preconiza uma gestão profissional de negócio, em que a impessoalidade deve prevalecer.
Saber separar as questões familiares na hora da reunião de trabalho, privilegiar os interesses da organização em detrimento do que cada um pensa, focar no coletivo, investir muito mais nas decisões baseadas em dados (objetivo) do que nas crenças e preferências (subjetivo), é imperativo.
5. Responsabilidades
Definição ampla e precisa do cargo e quais as suas principais responsabilidades, é essencial para que tudo que precise ser feito, realmente seja.
Isso contribui para que os colaboradores saibam a quem se reportar, para quem apresentam os resultados, por quem eles trabalham, bem como se orienta a administração eficaz do pessoal, afinal não faz sentido e nem produz resultados um time que tem vários “técnicos”.
E isso também tem relação com a hierarquia na empresa, quando pessoas com competências profissionais inferiores ou com papéis mais baixos na hierarquia profissional, conseguem se impor nas decisões que não lhe cabem, mas o fazem por terem ascendência mais alta dentro da família.
6. Financeiro
As questões financeiras são outro desafio frequente, especialmente quando o lucro é tratado exclusivamente como fonte de renda dos sócios, quando há dificuldade em separar o que é dinheiro da empresa e o que é dinheiro da família, além de uma boa distinção do que é o salário ou pró-labore de cada parte envolvida.
Definir um pró-labore e cuidar para que a diferença seja sempre aplicada no próprio empreendimento, é crucial para amparar o futuro do negócio.
É preciso planejamento financeiro e foco nos investimentos necessários para a garantia de vida e desenvolvimento da empresa, bem como consolidação de reservas, pagamento de colaboradores, pagamento de fornecedores, impostos e outros custos básicos, devem vir antes da compensação do negócio.
7. Profissionalização
O “status” de ser filho ou o irmão mais próximo do dono, não deve ser visto e tratado como garantia de nada.
Ocupar uma posição na empresa apenas pela proximidade do parentesco, é um dos erros com mais consequências ao longo do tempo e impactos nos resultados na área em que o parente ocupa cargo de gestão, tanto porque ele não exercerá liderança eficaz, como porque não dispõe das competências e requisitos que o cargo exige.
Sendo assim, é essencial que aqueles que inicialmente ocuparam um cargo em função do parentesco, invistam em cursos, treinamentos e se possível, que a empresa tenha um programa de educação corporativa para capacitá-lo continuamente.
8. Gerações
O convívio de diferentes gerações no mercado de trabalho é um problema que requer atenção e cuidados em todos os tipos de empresas, mas nas familiares pode ser ainda mais crítico.
Isso porque o fator pessoal agrava as diferenças comportamentais e de crenças e valores, que afastam e comprometem o relacionamento profissional de diferentes gerações.
Pais e filhos, tornam as divergências profissionais ainda mais extremas, pelo vínculo que têm.
Ambos se permitem ser mais radicais em seus pontos de vista, muitas vezes comprometendo os resultados, a comunicação e até mesmo a eficiência da gestão de suas equipes, quando os colaboradores veem que não existe consenso. Ou pior ainda, quando há conflito.
9. Atualização
Por fim, mas não menos importante, a falta de atualização em muitos níveis em relação ao mercado, costuma ser uma característica presente no negócio familiar.
Quando acontece, costuma ser resultante da falta de profissionalismo e da informalidade que às vezes está associada, lembrando que é comum que o responsável por cuidar disso, pode estar ocupando o cargo não pelo profissional que é.
Costumam pecar na atualização dos seguintes aspectos:
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Tecnologias usadas nas mais diversas áreas, especialmente nas mais paternalistas;
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Processos e métodos, sendo que algumas vezes não existem nem mesmo procedimentos operacionais padrão para nada;
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Conhecimentos e autodesenvolvimento profissional;
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Dos seus próprios colaboradores, uma vez que não costuma haver políticas de formação de gestores.
Conclusão
Compreender a realidade das empresas familiares, suas características, bem como as vantagens e desafios, é vital para prover soluções eficazes.